Após ter jogado “Two Point Campus”, senti que a Two Point Studios tinha perdido a sua magia. O gerenciador de faculdades não era exatamente o que eu esperava de uma sequência para “Two Point Hospital”. A progressão mudou, o sistema de semestre letivo não era intuitivo, e as escolhas eram bastante limitadas. Depois de algumas boas horas com o novo projeto da equipe, “Two Point Museum” (Steam / PlayStation / Xbox), sinto um pouco mais de confiança sobre o futuro da empresa e da franquia no geral.
A versão preview, concedida a nós pela SEGA, mostrou uma estrutura bem mais próxima de “Two Point Hospital” – no caso, algo também reminiscente do clássico “Theme Hospital”, mas com o óbvio twist de museus.
Se você já jogou um título da desenvolvedora, sabe mais ou menos o que esperar de “Two Point Museum”. Você começa cada museu com um conjunto de peças para uma possível exposição e tem que trabalhar para montá-la e expandi-la. Quanto mais itens, mais renome e mais visitantes o seu museu vai receber.
Não demorou muitos minutos para eu notar que a equipe da Two Point Studios estava mais do que disposta a demonstrar tudo o que aprendeu ao longo desses anos trabalhando na franquia. Cuidar de um museu é, obviamente, bastante diferente de cuidar de um hospital ou de uma universidade, mas a desenvolvedora conseguiu criar uma cadência de “sempre ter o que fazer” sem que ele se torne maçante.
Uma das grandes diferenças – uma bastante positiva – é que a Two Point Studios usa uma metodologia “menos é mais” para “Two Point Museum”. Uma das minhas grandes críticas a “Two Point” Hospital era a presença quase constante de eventos e doenças “invisíveis” que lotavam os seus hospitais e geram uma carga de microgerenciamento desnecessária. Isso sem contar com dezenas de atributos passivos para os seus funcionários que tinham um aumento ou redução da sua capacidade de trabalhar que era irrisório.
Tudo é “palpável” em “Two Point Museum”. Funcionários que trabalham diretamente com o público têm atributos claros e podem ser mais focados em atendimento na loja de presentes ou na venda de tickets. Especialistas em arqueologia podem ser treinados para que sejam mais ágeis na limpeza de fósseis ou pra que tenham menos chance de sofrer danos nas expedições (mais sobre elas em breve).
Em museus com temas mais pré-definidos, como é o caso do museu de preservação da vida marinha, especialistas vão ter mais afinidade com certos tipos de peixes, ou mais facilidade de cuidar de aquários ou aclimatar certos ambientes.
Cada pedacinho do museu requer uma dose de cuidado que não estava tão proeminente em “Two Point Hospital”. Uma nova peça para a exposição significa colocar possíveis quiosques de informação para gerar “conhecimento” aos visitantes — que, aliás, contam com diferentes arquétipos e necessidades diferentes —, encher os cofres do museu com doações, mudar o layout de uma ou mais salas para acomodar tais quiosques ou itens decorativos para aumentar o prestígio da peça ou completar objetivos secundários.
Se fosse em “Two Point Hospital”, eu colocaria salas de consulta, exames e afins sem pensar muito na localização. Era um hospital, o layout não importava tanto. Além do que, o título que colocou a Two Point Studios no mapa tinha sérios problemas de pathfinding que nem mesmo o mais bem organizado dos hospitais seria capaz de resolver. Fico feliz em dizer que isso é coisa do passado.
De fato, é algo tão do passado que a adição que mais me deixou contente em “Two Point Museum” é a introdução de um sistema de “fluxo” de visitantes. Os visitantes vão automaticamente para as peças da exposição com mais prestígio – valor definido pela quantidade de objetos decorativos e a sinergia entre eles – e posteriormente vão para o restante do museu. Entretanto, você agora pode criar barreiras de delimitação, portas temáticas de “acesso único” que “guiam” os visitantes para outras áreas do museu e fazer com que eles não fiquem amontoados em cima de uma única exposição e acabem criando congestionamento. E, para aqueles que acompanham os meus textos por anos, os visitantes agora encontram o caminho para o banheiro sem problemas. Aleluia!
A inclusão do sistema não só alivia, e muito, as minhas principais críticas com o pathfinding usado pela Two Point Studios, mas abre um leque de personalização que até eu, que sou uma pessoa bem “prática” no que diz respeito a soltar a criatividade em jogos, fiquei encantado.
Transformar o museu de uma estrutura “sem sal” a um tour por diferentes temas é delicioso. A Two Point Studios expandiu todas as ferramentas de criação, com a inclusão de portas temáticas, novos tipos de pisos que podem ser alterados para criar padronagens diferentes e um sistema de “paredes” para separar exposições – este último tão bom que que até fiquei com “inveja” de não ter nos jogos anteriores.
Mas “inveja” mesmo eu senti quando eu estava com o museu a todo vapor e mesmo assim ainda não tinha atingido um nível de estabilidade financeira. Em outros jogos da franquia “Two Point”, dinheiro caia que nem uma tempestade; “Two Point Museum” pede para você pensar e repensar as suas finanças. Grande parte disso vem do sistema de expedições que, simples em mecânicas, gera um rombo na sua conta quando você expande o museu rápido demais.
As expedições é onde você vai obter os principais objetos para o seu museu, sejam eles peixes, fósseis ou móveis mal-assombrados – caso exclusivo da “Mansão mal-assombrada” que estava disponível na versão preview. Selecione uma região para explorar, envie um ou mais especialistas, e torça para que eles voltem com fósseis e não com uma doença.
Toda a economia de “Two Point Museum” se amarra de forma primorosa com esse sistema. Quando a Two Point Studios abraçou o conceito “menos é mais”, isso significa que um especialista em campo é menos um especialista cuidando do museu. Não dá mais para contratar dezenas de especialistas, atendentes, faxineiros, e esperar que o saldo fique no positivo.
Além do que, os atributos de cada um deles os torna quase que “cruciais” para o funcionamento do museu. As próprias expedições em si são caras e podem durar de 20 a 30 dias em jogo; tempo que passa relativamente rápido, mas é mais do que o suficiente para possível desestabilização no museu. Foi o que aconteceu com o meu museu de preservação marinha.
Na minha ganância de obter a maior variedade de espécies de peixes para uma nova mostra do museu, eu enviei três expedições seguidas. Todavia, essas expedições requerem redes especiais para diferentes espécies de peixes e em climas diferentes (tropical, temperado, etc). Não há como comprá-las, apenas produzi-las em uma oficina, o que já custa tempo e dinheiro.
Junte “A” + “B” e não tardou para que meus aquários ficassem sujos de lodo, peixes morrendo e especialistas doentes se recuperando de uma queimadura de água viva ou alguma outra situação pavorosa. Eu não tinha dinheiro para contratar mais especialistas, e demitir os que eu tinha era uma grande furada, considerando o quanto tinha investido de tempo e dinheiro para que eles tivessem todos os melhores atributos para o meu museu. O que me restava era cruzar os dedos e torcer para que o museu não fechasse as portas. Ele não fechou.
E mesmo se tivesse, mesmo se eu tivesse perdido o meu save inteiro da versão de preview, eu não me importaria nem um pouco de fazer tudo de novo. Em meio a tantos sistemas de diferentes graus de complexidade, o humor irreverente da Two Point Studios está mais presente do que nunca. “Two Point Hospital” tinha lá o seu humor ácido, os alto-falantes da “rádio interna” do hospital e sua locutora com piadinhas prontas para soltar como uma metralhadora toda vez que algo dava errado no hospital. “Two Point Museum” vai para um tom mais colorido, vibrante e cheio de energia.
Os meus museus ficaram “finalizados” como um local repleto dos mais diferentes tipos de pessoas, marcados por acontecimentos como crianças subindo em fósseis e quase os destruindo pois eu esqueci de colocar um brinquedo especial para elas, fantasmas fugindo de seus locais de “exposição” e perseguindo tanto os visitantes como a própria equipe do museu. O museu de preservação de vida marinha tinha mais peixe palhaço do que qualquer outra espécie só porque eu dava gostosas risadas com o nariz de palhaço e a cara de “enfezado” que a equipe de arte do jogo produziu.
Anos de cobertura de jogos criaram um “calo” em mim, e fico com o pé atrás toda vez que um novo projeto vem com a promessa de ser “melhor” do que o anterior, de que vai inovar, rejuvenescer uma franquia. Como tão bem pontuei no começo do texto, a magia da Two Point Studios tinha sumido para mim. “Two Point Museum” reacendeu essa magia, e reafirmou para mim que os quase sete anos desde o lançamento de “Two Point Hospital” foram muito bem utilizados. Esta é a sequência que eu aguardei por anos, e ver que ela está mais do que na direção certa – ouso até dizer que está no caminho de virar um fantástico jogo de gerenciamento em 2025 – me deixa muito contente.
Vou aguardar ansiosamente, roendo as unhas, até março de 2025 — data prevista para lançamento do game no PC e consoles — para continuar a expandir e melhorar os meus museus, enviar novas expedições e descobrir o que mais “Two Point Museum” tem a me oferecer. E, quando me cansar, vou personalizá-los até ficarem “perfeitos”. Digo, até algum visitante quebrar uma peça rara ou uma criança subir em e sem querer desmontar a minha exposição de um T. Rex.