Embora eu tenha uma grande afinidade por jogos como “House Flipper”, eu sinto que o gênero de “conserte coisas ou repare casas” se engessou desde meados de 2018. Um recorte capitalista demais e uma ênfase apenas no processo de “conserto” e menos em estabelecer uma ambientação, ou até mesmo uma narrativa, me afastaram. Isso é, até ter a oportunidade de conhecer “The Lift” (Steam), em produção pela Fantastic Signals.
Nele, você assume o papel de um homem conhecido apenas por “o guardião”, um personagem que pode não falar muito, mas mostra em poucas ações como é cheio de orgulho por uma vida dedicada a consertar coisas quebradas. Uma “habilidade” que vai ser mais do que útil na sua vida no local conhecido apenas como “O Instituto”.
Alternando entre arquitetura brutalista e antigos panfletos soviéticos, “O Instituto” é uma instalação científica que preza pela sua organização e pelos seus avanços tecnológicos. Novas formas de geração de eletricidade, métodos mais práticos para organização de cartas e outros documentos. Há uma “vibe” bem anos 70 do Leste Europeu que me fez apaixonar pelos seus ambientes em questão de segundos. Ainda bem, já que eu iria ter que explorá-los com afinco.
Apesar de todos os supostos avanços feitos pelo “O Instituto”, ele ainda não solucionou um dos maiores problemas de toda a humanidade: a falha humana. É assim que “O Guardião”, após um curto período de treinamento, é colocado em hibernação e simplesmente esquecido no local.

Imagine acordar e o local onde você trabalha agora está abandonado, tomado por uma gosma escura e praticamente todos os serviços essenciais pararam de funcionar? Se eu fosse o guardião, eu teria enlouquecido de tanta coisa que eu teria que arrumar. Pera, mas eu sou o guardião, então eu vou ter que consertar tudo isso.
Para isso você vai ter o apoio dos Rubus, um conselho formado por personagens “excêntricos” que servem para te explicar mais sobre o instituto e te fornecer objetivos. Eles entram em contato ocasionalmente via interfones localizados pelos mapas para conversar com você, mencionando vários problemas e encarregando-o de resolvê-los.
Aqui vem uma das cartadas de mestre da Fantastic Signals. Cada personagem pode até ser “excêntrico”, mas a variedade de personalidades – a dinâmica com que conversam entre eles, as vezes até atropelando falas – é hilário. O gerente de projetos tecnológicos tenta enfatizar a importância de uma nova máquina que foi construída só para ser cortado quase que imediatamente pelo chefe de “consertos” mandando você resolver o problema o quanto antes.
Eu sentia falta dessas interações em um jogo onde o objetivo principal é, bem, consertar as coisas. “The Lift” traz uma sensação de coletividade, de que você não está necessariamente fazendo algo para apenas “melhorar” ou ter um “lucro”. Sabia que no fim do dia era essa a função do “guardião”, mas é muito mais prazeroso quando você sabe que está ajudando algo “maior” do que você. Mesmo que eu sentisse que havia algo há mais sobre o universo de “The Lift” que a desenvolvedora não revelou durante a demo.

Quando é a hora de pôr a mão na massa e resolver problemas, você vai ter múltiplos objetivos – e subobjetivos – em andamento a qualquer momento. Elas são rastreadas em seu dispositivo portátil, o Bureau Utility Gadget, ou “B.U.G.”, e variam de tarefas simples, como acessar uma sala bloqueada, a tarefas obscuras, como “Levar a produção de ondas ao nível 3” (descobri que era um eufemismo para “conserte o máximo de coisas possível”)
A primeira tarefa é encontrar o elevador e movê-lo para um andar diferente. Cada andar é essencialmente um quebra-cabeça gigante que você precisará reverter ao seu estado original, não deteriorado, desbloqueando andares mais altos e levando você cada vez mais perto de… bem, o que quer que esteja deixando manchas escuras de gosma por toda parte.
Então, o que precisa ser consertado? Às vezes, é simplesmente substituir um parafuso em uma cadeira instável. Você também encontrará placas de circuito danificadas com peças faltando. Às vezes, isso envolve encontrar uma peça sobressalente em uma prateleira e, outras vezes, pode ser necessário adquirir um “motor elétrico giratório” em uma máquina de venda automática.
No fim da demo eu estava sobrecarregado de parafusos, cabos de energia e tantos outros itens. Felizmente, “The Lift” tem um inventário bastante intuitivo que separa muito bem cada tipo de peça que você tem em mãos (ou nos seus bolsos que aparentemente não tem fundo). Outro toque interessante é que o jogo automaticamente sugere qual peça usar no local. Especialmente útil quando você tem que usar uma abelha na tomada de abelha. E, sim, falo de uma abelha-robô que gera energia.

“The Lift” também não entra demais no território de te fazer montar móveis inteiros do zero. Às vezes apenas um parafuso seja necessário para realinhar um banco inteiro, por exemplo. Mas se você está pensando que não deve ser muito desafiador lidar com parafusos e lâmpadas, pense outra vez. Os quebra-cabeças também se “espalham” pelo ambiente e requerem uma boa dose de exploração; um dos obstáculos que encontrei foi bastante complexo e exigiu uma exploração séria antes que eu descobrisse a solução.
Quando eu não estava tentando resolver uma das centenas de pedidos do Rubus, eu estava fascinado em como a Fantastic Signals conseguiu transformar interações que em jogos do gênero são um tanto quanto “estéreis” em algo tátil. Consertar um painel não é um mero clique de botões até que ele abra. A desenvolvedora teve um carinho especial em fazer com que cada elemento do jogo tenha uma “identidade” própria, um processo de abertura e fechamento.
Consertar um motor, por exemplo, requer que você mova o mouse para abrir o painel, depois gire algumas engrenagens para a esquerda ou direita para removê-las, e depois trocá-las por engrenagens novas, repetindo o processo da forma contrária. Isso é acompanhado por efeitos especiais espetaculares que dão um ar de que aquele motor tem uma vida própria – uma história – e você está contribuindo para ela.
No final da demonstração, também obtive acesso à criação e gostaria de ter tido mais tempo para explorar essa funcionalidade. Ao inserir um número específico de objetos defeituosos encontrados pelo mapa — que vão de cafeteiras até calculadoras gigantes — em uma máquina de criação, eles são transformados em novos módulos de reparo sofisticados. Se uma placa de circuito complexa estiver causando dificuldades, sua sala de criação vais ser a sua companheira.

Como fã de jogos com sistemas de crafting, minha breve experiência com o sistema de “The Lift” foi um dos pontos altos. Os itens criáveis desta versão apresentam apenas o básico, como cabos e unidades de energia, mas estou ansioso para ver o que mais poderemos criar no futuro. Mais abelhas para fazer as placas de circuito funcionarem novamente? Ferramentas ainda mais malucas?
A mesma sensação “tátil” do sistema de conserto também se aplica ao sistema de crafting. Nada é um mero “clique de botões”, mas sim uma máquina que requer que você coloque os objetos, aperte botões gigantes que tem a sua própria animação e puxe alavancas para criar itens. Vocês não têm noção da falta que isso me fazia em um jogo.
Os desenvolvedores afirmaram que seu objetivo é apresentar uma visão muito mais otimista e positiva do conceito soviético de produtividade. A narrativa, ao contrário, sugere mais instabilidade. Eu não chego a dizer que isso é um ponto negativo — mas a sátira soviética positiva é um tema incomum que espero que o jogo final explore mais.

Eu não tenho sombra de dúvidas que os fãs do gênero quebra-cabeças ou aqueles que — como eu —, estão mais do que cansados de jogos sobre “conserto” que se aderem ao mais puro “básico” vão se sentir revigorados com a abordagem de “The Lift” para a solução de problemas.
Eu mal posso esperar para descobrir o restante do “O Instituto”, quais mistérios ele vai me apresentar e as fantásticas interações entre o meu personagem e o Rubus.
Não sei o que o restante de 2026 me reserva, mas “The Lift” já está bem perto do topo das minhas prioridades quando ele for lançado. Meu desejo de consertar coisas é insaciável, e fico feliz de ver uma desenvolvedora finalmente evoluindo o conceito.