Confesso que fico decepcionado quando olho a quantidade de tempo que eu investi nos DLCs de “Two Point Hospital”. Não necessariamente por serem ruins — eles não são — mas por serem “mais do mesmo”. Mudanças pontuais e dezenas de adições “invisíveis” que só davam trabalho. Foi um alívio ver que “Two Point Museum” optou por qualidade ao invés de quantidade; como escrevi na minha crítica anterior; e o seu primeiro DLC, “Fantasy Finds” (Steam, Xbox, PlayStation), continua o novo modus operandi da Two Point Studios.
A premissa pode soar estranha: “Fantasy Finds” adiciona uma coleção de relíquias — como espadas, partes de monstros, e itens decorativos — que parecem ter vindo de um universo paralelo de fantasia. Até eu fiquei com o pé atrás – isso porque o jogo base já possui um museu “mal-assombrado”. Mas, depois de algumas horas com o DLC, há uma inegável atenção aos detalhes que a desenvolvedora não tinha atingido com seus DLCs anteriores.
Ao invés de seguir o modelo de “aqui está mais um museu com uma temática relativamente específica”, como o que foi feito com “Two Point Campus” e “Two Point Hospital”, “Fantasy Finds” se integra ao jogo base de forma natural. Um novo mapa de expedição é listado no menu, e os especialistas requeridos para obter as relíquias citadas acima começam a povoar a sua lista de potenciais candidatos. Onde colocá-los? No museu que você preferir.
Quão insano seria você chegar para ver uma exposição sobre dinossauros, e na metade dela descobrir que há uma ala exclusiva para espadas ou línguas de monstros? Foi o que eu fiz com um dos meus museus.

A chave aqui é coerência e consistência. A Two Point Studios sempre foi muito boa em manter um estilo visual coerente, mas em vários momentos — especialmente em “Two Point Campus” — o caldeirão de ideias da desenvolvedora borbulhava um pouco demais. Gerenciar as universidades naquele game, era, no mínimo, uma tentativa de unificar conceitos absurdos demais até mesmo para a desenvolvedora. Me lembro bem de quando vi uma aula de combate de lanças e pensei “Ok, isso não deveria estar em uma universidade”.
Agora, “Vamos enviar especialistas vestidos com roupas de classes de um RPG tal como uma campanha de ‘Dungeons & Dragons’”? Me soa sensato. Ainda que o jogo não aborde temas como religião, quantas religiões politeístas tivemos ao longo da história da humanidade? O que as faz – ao menos aos olhos da “antiguidade” – diferentes de algo mágico ou fantasioso? A Two Point Studios não faz tal alusão em momento algum, mas para mim, ver pegadas de dinossauros em um museu e no mesmo museu uma espada vinda de uma terra distante — ao menos no que tange ao universo criado pela desenvolvedora — parece completamente plausível.
É neste mesmo universo que contratar ou treinar um dos seus especialistas para ser um “bardo”, soa como algo do cotidiano. Aliás, pode se preparar para investir muito tempo e dinheiro se você quer explorar tudo o que “Fantasy Finds” tem a oferecer; a desenvolvedora não esconde que ele é uma adição para os museólogos mais experientes, aqueles com museus de altíssima qualidade e renome.

Toda expedição para obter uma das relíquias de “Fantasy Finds” funciona como uma “minicampanha” de um RPG de mesa. Você precisa ter todos os tradicionais arquétipos de uma party de RPG. Um especialista guerreiro, um bardo, um mago, e um ladino. Se você já jogou “Two Point Museum”, sabe muito bem que enviar especialistas para expedições já é um investimento monetário alto; agora imagina ter que equilibrar as contas quando mais da metade da sua equipe – pelo menos nos museus que administra – está em uma expedição? Quem vai limpar os fósseis, realizar tours?
Eu não dei muita bola de início. “O museu vai ficar bem”, disse a mim mesmo, com a mesma confiança de que deixar uma criança em um parquinho é uma boa ideia. Levantei-me para preparar um café e um lanche. Voltei e encontrei o caos.
Filas imensas para a compra de bilhetes, tours completamente interrompidos, nem mesmo a loja de acessórios estava funcionando. Eu demorei pelo menos seis meses para parar de sangrar dinheiro.
Ah, se eu tivesse prestado mais atenção, veria que a expedição que eu escolhi ia durar 120 dias e me custar o triplo da média. Mas, olhando para trás, valeu a pena. O meu grupo de especialistas me trouxe uma relíquia de uma espada pristina, rara. Mas o resultado era o que menos importava. Foi a jornada que a expedição tomou que a fez tão marcante.

Em uma reviravolta que eu não estava imaginando, a Two Point Studios deu uma tremenda repaginada no sistema de expedições para “Fantasy Finds”. Você ainda está limitado a uma ou duas escolhas por etapa, mas as etapas agora são mais complexas e a narrativa muito mais envolvente. Foram embora os um ou dois parágrafos que eu estava acostumado a ler no jogo base, e toda expedição agora realmente tem aquela sensação de aventura.
Seus especialistas vão se prender em vinhas sencientes, outros terão que invocar “magias” ou usar as suas “habilidades” para salvá-lo. Vi meu mago falhar ao tentar derrotar um monstro, e foi resgatado pelo paladino. Melhor ainda é que há uma variedade enorme de cenários, e a geração aleatória de nomes para cada expedição – que não pode deixar de ter um ou outro trocadilho com “Senhor dos Anéis” – faz com que a repetição delas, um dos pontos que critiquei no jogo base, seja muito mais tolerável.

Esse mesmo carinho e atenção foi dado aos novos objetos interativos para o público infantil – tipicamente usado para evitar que as crianças destruam as suas exposições. A equipe de animação da Two Point Studios merece uma salva de palmas por conseguirem dar vida e uma identidade mais forte até para os mais genéricos dos objetos, com pequenos detalhes e animações que saltam aos olhos e me fizeram apreciar ainda mais o meu museu. E, quando o tema é um mundo de fantasia, as chances de cair no genérico são altíssimas. O pior que aconteceu foi eu revirar os olhos quando um trocadilho horrível apareceu na minha tela. E se tem uma coisa em que a desenvolvedora se tornou expert, são trocadilhos horríveis.
A minha única decepção – se é que posso chamá-la disso – com “Fantasy Finds”, é a necessidade de acomodar a exposição em um dos seus museus. Sei que comentei acima que preferi a ausência de um novo museu temático, mas o DLC se encaixa melhor em museus focados na pré-história do que, por exemplo, um museu de vida marinha. Eu queria que a desenvolvedora tivesse colocado ao menos algumas peças “exclusivas” para os museus já presentes no jogo. Seria um ótimo incentivo para revisitá-los ainda mais.
E, se você é um perfeccionista como eu, é bom se acostumar com a ideia de demolir uma parte do museu para ter espaço para uma nova exposição. E, você sentiu aquela dorzinha no coração de ter que refazer parte do seu museu, detalhe por detalhe, acredite, também doeu em mim.

O que fecha com chave de ouro é o incrível suporte pós-lançamento que “Two Point Museum” vem recebendo desde que ele saiu. Uma atualização em maio (3.0) trouxe novos traços para os seus funcionários, novos papéis de parede, e mais animações. A atualização de junho (4.0) veio acompanhada de um novo museu, mais variantes de visitantes, itens decorativos e novos objetos para otimizar a climatização do seu museu. Nem em sonho que “Two Point Hospital” ou “Two Point Campus” teriam recebido essas atualizações.
Qualidade acima de quantidade é a melhor forma de seguir em frente com “Two Point Museum”. Se “Fantasy Finds” foi um gostinho do que está por vir para o jogo de gerenciamento, foi um gostinho maravilhoso. Meu tempo com ele foi repleto de risadas, revirada de olhos com os trocadilhos, e os momentos de desespero quando as minhas finanças foram para o brejo.
Não sei o que a Two Point Studios planeja para o futuro do jogo no que tange a DLCs, mas se a equipe conseguiu adaptar um universo de fantasia para um título de gerenciamento de museus, o leque de opções agora aparenta ser infinito. Mal posso esperar pra ver qual ideia “maluca” eles implementarão no futuro.
Two Point Museum: Fantasy Finds
Total - 9
9
Embora não venha com um mapa “exclusivo” como nos últimos DLCs produzidos pela Two Point Studios, “Fantasy Finds” se encaixa de um jeito relativamente natural na maioria dos museus de “Two Point Museum”. Mostra, outra vez, o amadurecimento da equipe em prover qualidade acima de quantidade e de pegar até mesmo ideias absurdas e fazer com que elas funcionem dentro do universo da sua franquia. Essencial para quem gostou do jogo base. Só se prepare para demolir uma parte do seu museu para acomodar uma nova exposição e fique de olho, bem de olho, nas suas finanças — para não falir.